Revista Petro & Química
Edição 370 • 2017

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Petróleo & Gás
Fórmula sob medida
 
Os desafios do pré-sal impulsionam o desenvolvimento de fluidos de alta performance | Flávio Bosco
 

Os reservatórios do pré-sal, que já representam 47% do petróleo produzido no Brasil e representarão ainda mais nos próximos anos, são um desafi o para as operadoras – mas também uma oportunidade para pesquisadores. Atravessar 2 mil metros de lâmina d’água e 5 mil metros de rochas e sal para retirar esse petróleo tem exigido formulações químicas de alta performance – que tenham a capacidade de preservar suas propriedades até chegarem ao reservatório.

“O pré-sal exige algumas adequações, tanto do produto quanto da formulação. Os fl uidos devem ter a capacidade de performar diante das variações de pressão e temperatura da lâmina d’água e em contato com o óleo”, ressalta o gerente de P&D de Petróleo e Gás da Oxiteno, Guilherme Fonseca.

Dois anos atrás a empresa decidiu disputar esse mercado de fl uidos químicos, dominado por multinacionais – algumas delas com produção local. Reuniu pesquisadores e equipou seu Centro de P&D para produzir os intermediários que são utilizados na formulação de fl uidos de perfuração, desemulsifi cantes e anticorrosivos. O destaque é um equipamento que permite simular as variações de temperatura e pressão que os fl uidos encontrarão no caminho até o reservatório.

As maiores apostas das empresas que atuam nessa área são os anticorrosivos, que permitem lidar com os altos teores de CO2 e H2S, e os desemulsifi cantes, que auxiliam a separar o óleo da água – mesmo que a demanda por esses produtos seja pequena nos primeiros anos de produção, ela deverá crescer signifi cativamente quando a extração nos poços do pré-sal exigir injeção de água. Há também boas perspectivas para os fl uidos de perfuração de alta performance – que dependem diretamente da atividade exploratória, ainda retraída com o fim dos programas exploratórios e a queda dos preços do petróleo.

A consultoria Freedonia Group projeta um crescimento de 4,9% ao ano na demanda de produtos químicos no Brasil, para algo em torno de US$ 840 milhões, até 2019, impulsionado pelas atividades no pré-sal – onde há maior potencial imediato de geração de fl uxo de caixa. O limite pode ser justamente a capacidade de execução dos investimentos previstos pela Petrobras e outras operadoras. Para o mercado global a Freedonia aposta em um crescimento de 6% ao ano até 2019, quando deve atingir US$ 33 bilhões, puxado pelos fl uidos de perfuração avançados e químicos para estimulação de poços – no curto prazo os preços do petróleo devem favorecer o desenvolvimento de fl uidos de perfuração de alto desempenho e fl uidos de estimulação utilizados para a exploração de áreas não convencionais.

Em qualquer pesquisa, o desafi o é reproduzir o cenário em laboratório – e depois provar que aquele produto irá repetir no campo o mesmo comportamento. A concepção de formulações customizadas que viabilizem o investimento tem por base a profunda compreensão da química e da interação das moléculas – no pré-sal, a alta pressão e alta temperatura exigem ajuste não só das ferramentas, mas também dos fl uidos utilizados na perfuração e na cimentação do poço. O rendimento da perfuração tem relação direta com o ajuste do fl uido à formação. Por serem mais estáveis a altas temperaturas, os fl uidos de perfuração a base óleo são mais adequados para esse cenário. Mas eles esbarram em restrições ambientais. Algumas matérias-primas acabaram substituídas por outras com melhores índices de toxicidade e biodegradabilidade. O custo superior, no entanto, é um limite para os fl uidos a base de água ou renováveis.

Um dos capítulos do Estudo do Potencial de Diversifi cação da Industria Química Brasileira, elaborado pela Bain e pela GasEnergy dois anos atrás, avaliou a oportunidade de produzir localmente fl uidos de perfuração de base oleoquímica – para aproveitar a disponibilidade de óleos de soja e palma.

Sua viabilidade dependeria diretamente de ajustes fi scais e tributários. Outra rota que ainda precisa se provar viável é a utilização de nanopartículas tanto na perfuração como na recuperação avançada de petróleo. Um projeto de pesquisa que uniu a PUC-Rio, a Universidade de São Paulo - USP e a Norwegian University of Science and Technology - NTNU conseguiu provar em laboratório uma nanoestrutura de laponita, uma argila sintética, para estabilizar emulsões – falta agora provar sua efi cácia em aplicações reais.

Nessa cadeia, há posições bem distintas, com empresas que fabricam os fl uidos base e prestadoras de serviço que atuam na formulação e aplicação. A Oxiteno faz parte do primeiro grupo. No Centro de P&D, a missão é encontrar a molécula adequada para a composição dos fl uidos – na formulação dos desemulsifi cantes, por exemplo, os pesquisadores avaliam a funcionalidade delas diante de diferentes tipos de emulsão óleo-água e identifi cam quais terão melhor desempenho. Parte das pesquisas, principalmente as voltadas a linha de estimulação, deverá ser feita no novo laboratório da empresa nos EUA. “Águas ultraprofundas, shale gas e shale oil e poços maduros são os cenários que mais demandam tecnologia da parte química. Então o desenvolvimento tende a se enquadrar em um desses três cenários”, explica Guilherme.

Os desemulsifi cantes, fl uidos de perfuração e completação e inibidores de corrosão são formulados com moléculas que tenham propriedades para interagir com o petróleo e outras coadjuvantes com propriedades específi cas, e compatíveis entre si. Cada fórmula reagirá melhor em um reservatório específi co. Em todos os casos, ensaios sempre serão necessários para selecionar o produto químico mais adequado e otimizar as condições de sua aplicação.

As novas formulações já têm atendido ao desafi o das altas pressões e temperaturas – e também a corrosão ácida causada pelo CO2 e H2S. A corrida, no entanto, ainda está aberta para o desenvolvimento produtos ainda mais efi cientes. “Sempre vai haver espaço para inovações, principalmente em se tratando de problemas tão complexos como os relacionados às perfurações no pré-sal”, afi rma a professora Regina Sandra Veiga Nascimento, do Instituto de Química da UFRJ.

 
 
Start up
Simulação fluidodinâmica para entender acidificação em carbonatos
Rodrigo (à dir.): simulador customizado para a Petrobras
O modesto número de amostras de reservatórios carbonáticos, mais um empecilho para apontar o fl uido mais adequado para a estimulação de poços, despontou como oportunidade para a Wikki Brasil, uma empresa de engenharia especializada em simulação fl uidodinâmica computacional incubada na Coppe/UFRJ. Seus pesquisadores desenvolveram o reactiveRhoPorousPimpleFoam – um simulador de acidifi cação em amostras de rocha para analisar o comportamento de um fl uido de estimulação ao ser bombeado através de uma amostra do carbonato nas condições do reservatório. “Com o simulador entregamos a não dependência de amostras para a Petrobras continuar suas análises. O resultado fi nal, através de diversas simulações, é o entendimento do comportamento da iteração entre ácido e rocha para ajudar a defi nir a técnica de estimulação adequada”, explica o engenheiro Rodrigo Dias, sócio administrador da Wikki.

Acidifi cação – a injeção de ácido na rocha para a retirada do dano e conexão com o reservatório através de canais de alta condutividade – tem sido a técnica mais usada para estimular os poços do pré-sal. A metodologia de acidifi cação em amostras de carbonatos é desenvolvida em algumas universidades e prestadoras de serviço – no Centro de Pesquisas da Petrobras, os experimentos têm como objetivo compreender o comportamento de um fl uido de estimulação quando bombeado através de uma amostra. O grupo de estimulação de poços da companhia já utiliza o simulador – que é o resultado da linha de pesquisa conjunta entre engenheiros da própria Petrobras e da Wikki Brasil. O modelo por trás do simulador é conhecido na literatura. A diferença é o encapsulamento das equações em um software customizado para a Petrobras.

A Wikki Brasil tem parceria com alguns professores da Coppe/ UFRJ e apoio da Wikki britânica – fundada pelo professor Hrvoje Jasak, um dos principais especialistas em simulação fl uidodinâmica. Hoje a empresa já tem entre seus clientes Furnas, Embraer, Hidroenergia e cinco universidades. O reactiveRhoPorousPimpleFoam é o primeiro produto na área de acidifi cação de poços. A Wikki Brasil já trabalha no desenvolvimento da mesma metodologia considerando ácidos divergentes. E também para adaptar o simulador para a escala de poço, entregando um produto que considera o processo de acidifi cação com menos hipóteses em relação aos simuladores da área.
 
 
 
 
 


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