Revista Petro & Química
Edição 367 • 2016

Clique na capa da revista para ler a edição na íntegra
Petróleo & Gás ................................................................................................................................
Além da água
 
Pesquisas trazem novas perspectivas para recuperação avançada de petróleo
 

Na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, um grupo de pesquisadores do Departamento de Engenharia Química estuda a injeção de microemulsões e nanoemulsões para aumento da recuperação em campos maduros. A ideia surgiu a partir das pesquisas com surfactantes e sistemas micro e nanoemulsionados – que têm ação superfi cial e alta capacidade de solubilização. Em laboratório, os testes têm apontado fatores de recuperação de 60% até 100%. Na Universidade de Campinas, a pesquisa envolve a injeção de polímeros – que tem como vantagem a antecipação da produção e redução dos volumes de água e solução injetados. A Statoil, parceira da Unicamp na pesquisa, planeja realizar um projeto piloto com essa técnica no campo de Peregrino, na Bacia de Campos.

Técnicas de recuperação avançada – ou recuperação terciária – têm potencial para aumentar o fator de recuperação dos reservatórios além dos percentuais obtidos com a injeção de água. Via de regra, as técnicas de recuperação secundária aumentam de 30% para 50% o volume de petróleo extraído de um campo – em alguns casos extraordinários, a injeção de água ou de gás pode chegar a 60%. As pesquisas mostrarão o real potencial que cada técnica de recuperação avançada terá para estender a vida útil de campos maduros.

A Petrobras adota essas técnicas de recuperação avançada há mais de 30 anos – a empresa já experimentou a injeção de polímeros e surfactantes, métodos microbiológicos, métodos térmicos e injeção de gás miscível (hidrocarbonetos ou CO2). A que está em operação a mais tempo e com maior número de casos é a injeção de vapor em campos terrestres.

Na maioria dos campos, a opção é a injeção de água – que já se provou ser o mais econômico em manter a pressão do reservatório. Essa técnica de recuperação secundária é responsável pelos fatores de recuperação esperados para os campos de Roncador e Marlim, o segundo e o quinto de maior produção do país. Também é utilizada nos principais campos terrestres do país. Canto do Amaro, na Bacia Potiguar, possui mais de mil poços e produz cerca de 15 mil barris por dia – na última década a Petrobras investiu em injeção de água e adensamento da malha do campo. Carmópolis também possui mais de mil poços e produz atualmente 14,5 mil barris por dia. Canto do Amaro produz há 30 anos e Carmópolis desde 1963. No campo de Estreito, também na Bacia Potiguar, a Petrobras adota a injeção de vapor – considerando a área submetida, o fator de recuperação sem esta tecnologia seria de 5 a 10 vezes menor.

Os maiores percentuais de recuperação são encontrados nos campos de Lagoa Parda, na parte terrestre da Bacia do Espírito Santo, que chega a 58,4% com a reinjeção da água produzida, e Namorado, na Bacia de Campos, com 58,8% a partir da injeção de água do mar.

Nem sempre esses processos convencionais apresentam bons resultados. A água ou o gás injetados, além de tentar manter a pressão do reservatório, empurram o óleo em direção aos poços produtores e ocupam o seu espaço dentro da rocha. Mas em reservatórios de óleo pesado, por exemplo, a água injetada transpassa o óleo e retorna à plataforma.

Dependendo das características do campo, a razão água-óleo torna a operação economicamente inviável. Nas técnicas de recuperação avançada, o objetivo é alterar outras propriedades – reduzir a viscosidade do óleo através da injeção de vapor ou aumentar a viscosidade da água com a injeção de polímeros, por exemplo.

O sucesso da aplicação dessas técnicas depende não só do tipo de óleo armazenado, das propriedades reservatório, ou das interações entre a rocha e os fl uidos. A localização do campo – em terra ou em mar – a profundidade, temperatura e a pressão do reservatório também interferem no resultado final.

O gerente de Soluções Tecnológicas da Halliburton, Mauro Nunes, adverte que todas as informações sobre o comportamento do reservatório ou do campo precisam ser coletadas – e através de várias técnicas, qualquer alteração para melhorar a produção, aumentar o fator de recuperação e reduzir os custos operacionais podem ser alcançadas. “O método de recuperação terciária é necessário na maior parte dos reservatórios, mas, por vezes, para melhorar a efi ciência e o deslocamento do varrido, pode ser economicamente inviável”.

Algumas técnicas foram desenvolvidas para contornar o problema. A Prevent Production of Unwanted Fluids - AICD tem por objetivo melhorar o desempenho e efi ciência da completação através do equilíbrio da vazão de água e da produção do poço, e a Offshore Water Treatment Applications - Sea- Wave trabalha com o processo de eletrocoagulação e fl otação induzida para quebrar as emulsões de óleo e água de modo a obter os parâmetros para descarte. “Para a gestão apropriada do reservatório, quando a manutenção da pressão é necessária e heterogeneidade e permeabilidade estão presentes, a tecnologia de Completação Inteligente - CI pode fazer a distribuição adequada de líquido injetado (água, gás ou ambos) nas respectivas zonas de interesse”.

Este processo pode ser extremamente desafi ador caso se deseje a distribuição da quantidade adequada de água em cada zona, evitando que uma quantidade signifi cativa de óleo possa ser deixada no reservatório. “Um perfi l adequado de injeção e melhor efi ciência de varredura são os principais desafi os ao tentar alcançar fatores de recuperação razoáveis, com a existência de estruturas de alta permeabilidade, como fi ssuras, fraturas e zonas erodidas-out, o que tende a diminuir a efi ciência de varredura de qualquer operação de injeção de água, gás ou polímero”.

No Brasil, essa tecnologia de Completação Inteligente já foi aplicada em mais de 50 poços. As técnicas de AICD e Seawave têm menos casos – a primeira foi aplicada em quatro poços, enquanto a Seawave tem sete unidades em trabalho. Nunes também destaca a Digital Oilfi eld – que integra dados de várias fontes em uma única plataforma – que implantada pela primeira vez na Bacia de Campos e hoje já conta com dez iniciativas. “O objetivo é, holisticamente, aumentar a eficiência operacional, a produção e o fator de recuperação, com foco sempre no controle de custos”.

Um novo campo em cada ponto percentual

Os campos maduros representam cerca de 40% da produção da Petrobras. Aumentar um ponto percentual o fator de recuperação em todos eles equivale a descobrir um campo de petróleo offshore de grande porte. No entanto, esta não é uma tarefa trivial.

A escolha da técnica mais adequada ao reservatório demanda um grande esforço de pesquisa tecnológica e de gestão.

Na costa da Noruega a Statoil conseguiu elevar para mais de 60% o fator de recuperação nos campos de Statfjord e Oseberg. Algumas das técnicas utilizadas incluem poços avançados (multilaterais) e infi ll, satélites submarinos, sísmica 4D e injeção de água e gás. Em 30 anos, Statfjord já produziu 4,7 bilhões de barris de petróleo – entre 2012 e 2015, sua produção média aumentou, e o campo tem produção esperada até 2025; 1% de melhoria na recuperação representa mais de 60 milhões de barris de óleo equivalente.

Em comparação com os campos noruegueses, os campos brasileiros são bem mais novos – a estratégia, nesse caso, é manter o foco em Improved Oil Recovery - IOR, ou recuperação melhorada. “Muito do aumento de recuperação vem de técnicas relacionadas a perfuração, completação de poço e também do gerenciamento do reservatório (recuperação secundária). Técnicas de perfuração, como poços multilaterais, infi ll e poços de alcance estendido (ERW), bem como operações de perfuração customizadas e uso da injeção (água / gás) desempenham um papel crucial na obtenção de óleo adicional”, afi rma a gerente de reservatório da Statoil, Maria Clara Costa.

No campo de Peregrino, na Bacia de Campos, a Statoil já adotou algumas das técnicas de IOR utilizadas na Noruega – três poços multi-laterais - MLT foram completados e estão em produção, dispositivos de controle de fl uxo (ICD/AICD) estão sendo usados em vários poços, e desde 2014 a injeção de água nas camadas de reservatório de óleo tem um projeto piloto em funcionamento. A aquisição de dados sísmicos de banda larga está sendo utilizada para melhorar o planejamento de poços, previsão de ocorrência de reservatório e geosteering. Em Peregrino foi perfurado o mais longo poço de alcance estendido do Brasil, com um afastamento horizontal de 8.080 metros. “Há uma gama de possibilidades para explorar técnicas de IOR no país. Algumas das particularidades de cada campo podem não ser aplicáveis a outros, mas em geral as técnicas podem ser adaptadas para cada reservatório ou instalação”, ressalta Maria Clara.

O Centro de Pesquisa da Statoil no Brasil mantém parcerias com a Unicamp e com a PUC-Rio em cinco projetos que têm como objeto de pesquisa o uso a injeção de polímeros e o desempenho de bombas centrífugas (elétricas) submersíveis na presença de emulsões.

“As principais vantagens associadas a um bom projeto de injeção de polímeros referem-se especialmente à antecipação da produção e redução dos volumes de água/solução polimérica injetados e produzidos”, explica a professora Rosângela Barros Zanoni Lopes Moreno, do Departamento de Engenharia do Petróleo da Unicamp. A injeção de polímeros para a recuperação de petróleo é aplicada principalmente na China e no Canadá. No Brasil, além de Peregrino, experiências já foram realizadas nos campos de Canto do Amaro, Carmopolis, Buracica, Frade e Papa- Terra. O grupo de pesquisa coordenado pela professora Rosângela desenvolve dois projetos: Métodos de recuperação de campos em águas profundas - injeção de polímero e Modelagem de reservatório para injeção de polímeros - simulação de pequena escala. O primeiro é voltado à caracterização do processo em laboratório – as propriedades da rocha de teste e dos fl uidos de reservatório são analisadas e o fl uido a ser injetado é projetado para que a razão de viscosidade alvo seja obtida. O estudo dos fenômenos associados ao escoamento de polímero através do meio poroso subsidia o time de modelagem do segundo projeto, que busca representar os fenômenos físicos associados à esse método de recuperação avançada.

Nanotecnologia

Uma grande esperança para aumentar o fator de recuperação reside na nanotecnologia. Isso porque é nas redes de poros de escala nanométrica que reside uma quantidade signifi cativa do petróleo.

No Laboratório de Nanoespectroscopia da UFMG, os pesquisadores irão utilizar a nanotecnologia para aumentar o volume de produção dos campos de petróleo – a Universidade fechou um convênio com a IBM Brasil, que já desenvolve estudos de nanociência e nanotecnologia e modelos computacionais focados na interação de materiais líquidos e sólidos.

“Dentro desta colaboração, os pesquisadores da IBM e da UFMG vão desenvolver e aplicar em conjunto novos métodos de investigação experimental que envolvem instrumentação avançada científi ca, dispositivos integrados e técnicas de medição altamente sensíveis. Esta combinação permite investigar pela primeira vez, os processos físicos e químicos fundamentais que determinam como os líquidos são ligados a superfícies sólidas em nanoescala”, conta o gerente de pesquisa na área de Ciência & Tecnologia para Aplicações Industriais do Laboratório de Pesquisa da IBM Brasil, Mathias Steiner.

Um dos projetos de pesquisa da IBM, relacionado a interação da superfície com líquidos, já enfatizou a importância da abordagem da neurociência na recuperação de petróleo – no início do ano a empresa teve concedida uma patente nos EUA. Esse conhecimento se junta agora à experiência em instrumentação científi ca do Laboratório de Nanoespectroscopia para construção de equipamentos e métodos que viabilizem a pesquisa por novos materiais, conceitos de dispositivos e métodos de medição em nanoescala. Em última análise, a indústria irá se benefi ciar desta pesquisa por meio de novas tecnologias de simulação e materiais funcionais que permitem estratégias específi cas para extrair mais petróleo de cada reservatório.

 
 
 
 


Todos os direitos reservados a Valete Editora Técnica Comercial Ltda. Tel.: (11) 2292-1838