Edição ESPECIAL 231 – Outubro de 2001

Anos 70 - Aprendizado e consolidação do setor no Brasil

Gaisel: criação da Braspetro e dos contratos de risco

Quem sobreviveu ao tempo que formatou o atual momento brasileiro de “lua de mel” da exploração e produção de petróleo ainda se lembra e traz vivo, certamente, os chamados choques do petróleo ocorridos nos anos 70. Juntamente com isto, a economia mundial perdeu parte do seu dinamismo, vendo as taxas de crescimento caírem naquela década, engessando por algum tempo a expansão que alcançava o mundo.
A crise internacional do petróleo desencadeada em 1973 afeta o desenvolvimento industrial e aumenta o desemprego. Diante desse quadro, o então presidente da Petrobras Ernesto Geisel propõe um projeto de abertura política “lenta, gradual e segura”. “A maior visão do Geisel foi aquela relacionada com a preparação gerencial de nosso pessoal. Assim, quando Geisel Presidente da República instituiu os contratos de risco, em 1976, o Sistema Petrobras já dispunha de pessoal com experiência adquirida no exterior em negociação e gerenciamento de contratos de exploração”, lembra o diretor de Exploração e Produção da Petrobras, José Coutinho Barbosa.
Notadamente o aumento do preço do petróleo acompanhou os chamados choques: no primeiro choque, em 1974, saltou do patamar de US$ 3 para US$ 10, permanecendo neste nível até 1978. Em 1979, ocorreu o novo choque e os preços chegaram a US$ 30, oscilando em torno deste patamar nos cinco anos seguintes, quando sobrevieram as crises de superprodução globais e a derrubada dos preços, como observam estudos da época.
A OPEP teve um papel de vilã neste momento pela conseqüente subida de preços e formação do cartel de produtores, num momento em que os membros da organização controlavam perto de 50% do total da produção mundial. Não se pode negar o fato de que a constituição deste cartel foi decisiva para explicar o aumento persistente dos preços.
O Brasil via nascer neste cenário o Programa Nacional do Álcool – Pró-Álcool, com o objetivo de ampliar as fontes alternativas de energia para fazer frente à crise do petróleo. Os investimentos se estenderam para o setor energético buscando um programa que implantasse um combustível substituto da gasolina, ao mesmo tempo em que se desencadeava uma campanha de racionamento de combustíveis. “Na hora em que o mundo quis uma resposta para a crise do petróleo, o Brasil apresentou o álcool, e hoje é um programa praticamente desativado”, lamenta Manoel Ortolan, presidente da Organização dos Plantadores de Cana – Orplana.

Campo de Garoupa: a primeira descoberta offshore importante

Braspetro como saída

No início desta década, a Petrobras faz as suas primeiras descobertas na porção terrestre da Bacia do Espírito Santo. Com o decisivo avanço para o mar e no rastro do Primeiro Choque do Petróleo, surge, em 1972, a Braspetro, braço internacional da Petrobras na tentativa de buscar no exterior o petróleo não encontrado internamente e o direcionamento dos investimentos para o downstream. “Aqui é importante ressaltar o grande alcance da visão do general Geisel, então presidente da Petrobras, que após o primeiro choque do petróleo, em 1973, constituiu a Braspetro para procurar petróleo no exterior, de modo a complementar as nossas necessidades internas”, pontua Coutinho.
Em seus 27 anos, a Braspetro passou por 32 países. Suas áreas de atuação concentraram-se, inicialmente, no Oriente Médio, na África do Norte e na Colômbia. Nos cinco primeiros anos de atuação da empresa, a magnitude das descobertas realizadas no Iraque (campos de Majnoon e Nahr-Umr) totalizaram reservas recuperáveis estimadas em dez bilhões de barris de óleo. Esta fase caracterizou-se pela ênfase especial conferida ao treinamento dos técnicos brasileiros e à contratação de consultores estrangeiros, alinhados com as mais recentes metodologias e tecnologias de exploração e produção e, finalmente pela primeira descoberta realmente importante, realizada no mar da Bacia de Campos no litoral do Rio de Janeiro, com o primeiro poço sendo perfurado em 1971. A primeira descoberta de petróleo foi feita em 1974 com a perfuração do oitavo poço, o poço 1-RJS-9; a produção de petróleo começou em 1977 e até o presente, mais de 60 poços de petróleo e gás foram descobertos na Bacia de Campos, sete dos quais campos gigantes de petróleo, todos em águas profundas.

Campo de Juruá: gás em plena Selva Amazônica
Bacia Potiguar: importante acumulação onshore
A ida para a Plataforma Continental baseava-se nos critérios de continuidade das bacias terrestres costeiras e na analogia com os seus resultados ou indícios. Nesta época, estimavam-se em 20 bilhões de barris as reservas de petróleo da plataforma. Os grandes deltas da margem continental brasileira, como os da Foz do Amazonas, São Francisco, Rio Doce, Paraíba do Sul e Rio Grande, geraram grandes expectativas, especialmente pela influência dos consultores americanos e pela analogia com os deltas do Níger e do Mississipi. O delta do Níger, no outro lado do Atlântico, já contava naquela época com mais de 20 bilhões de barris de petróleo de reservas. O critério da continuidade respondeu discretamente, porém o da analogia fracassou e os poços secos se sucederam na Foz do Amazonas, Espírito Santo e Santos.
Pró-Álcool: Na hora em que o mundo quis uma resposta para a crise do petróleo, o Brasil apresentou o álcool.
No apagar do ano de 1974, finalmente, a primeira descoberta importante aconteceu no mar: o Campo de Garoupa, na Bacia de Campos. No final de 1974, as reservas haviam aumentado para 1,445 bilhões de barris e a produção estava em 182.064 barris por dia. A confirmação do potencial da Bacia de Campos, a ocorrência do Segundo Choque do Petróleo, a criação dos contratos de risco, a descoberta de petróleo na porção terrestre da Bacia Potiguar e do gás do Juruá, a meta dos 500.000 barris por dia e, mais importante, a decisão de avançar a exploração para águas profundas marcam profundamente este momento brasileiro. As importações de petróleo a US$ 15/barril pesavam cada vez mais na balança comercial brasileira e assim, com a necessidade de maior produção interna, tem início o desafio da engenharia de produção com os sistemas antecipados.
A pressão da balança comercial resultou também na criação dos contratos de risco e o Segundo Choque do Petróleo agravou ainda mais a situação de dependência do petróleo estrangeiro. O treinamento dos técnicos da Petrobras foi acelerado, tanto no Brasil quanto no exterior. A Bacia de Campos se afirmou com as novas descobertas e o desafio da engenharia foi vencido com os sistemas antecipados de produção.
Campo de Namorado: primeiro gigante da Plataforma Continental Brasileira
Em 1975, foi descoberto na Bacia de Campos o Campo de Namorado, o primeiro gigante da Plataforma Continental Brasileira. Os contratos de risco, criados em 1976, permitiram, a partir deste ano, a presença das empresas estrangeiras, como a Shell, Exxon, Texaco, BP, ELF, Total, Marathon, Conoco, Hispanoil, Pecten, Pennzoil e companhias brasileiras, como a Paulipetro, Azevedo Travassos, Camargo Correa, além da Petrobras. Nesse período foi descoberto o campo de gás do Juruá, na Bacia do Solimões (1978) e a primeira acumulação terrestre da Bacia Potiguar (1979). No mar aconteceu a primeira descoberta, realizada por uma empresa sob contrato de risco, o campo de gás de Merluza, pela Pecten, na Bacia de Santos.
Pólo de Camaçari: consolidação do setor petroquímico no Brasil

Atualmente, a Bacia de Campos produz 650.000 barris de petróleo por dia, o que corresponde, aproximadamente, a 70% da produção brasileira de petróleo. Com as suas operações de exploração e produção, a Petrobras concentrou a maioria dos seus esforços de investimento na Bacia de Campos, no litoral do Rio de Janeiro e nas Bacias do Recôncavo, Sergipe-Alagoas, Potiguar e Ceará, na região Nordeste do Brasil.

Pólos Petroquímicos

A criação do Grupo Executivo da Indústria Química – GEIQUIM começa a desenvolver a indústria petroquímica no Brasil, estabelecendo orientações claras para a promoção e lançando as bases que viriam a germinar nos pólos petroquímicos dos anos 70 e 80.
Em 1976, existia apenas um pólo petroquímico no país, em Mauá – região metropolitana de São Paulo. Em virtude principalmente do programa de substituição de importações, pesados investimentos resultaram na criação de dois novos pólos petroquímicos no final da década. Com isso estava consolidado o setor petroquímico nacional.
Localizados em Camaçari / BA e Triunfo / RS, os pólos petroquímicos utilizaram um modelo societário engenhoso, denominado tripartite. O controle das empresas era compartilhado, em proporções iguais, pela Petroquisa – subsidiária da Petrobras, por um sócio privado nacional e por um sócio privado estrangeiro (que, normalmente, aportava a tecnologia). Desta forma, garantia-se, simultaneamente, o controle nacional e privado e o suporte tecnológico indispensável aos empreendimentos. Em ambos os casos, as empresas downstream têm o suprimento de matérias-primas garantido por centrais – Copene na Bahia e Copesul no Rio Grande do Sul.
Com este desenho da indústria de petróleo, os anos 70 se encerravam num contexto de aprendizado e crescimento da necessidade de iniciar uma provável autonomia, que ainda se espera ser mais concreta.

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